A Igreja de Bento XVI tem-se caracterizado pelo negacionismo. Por um lado lado é uma igreja que aceita e acolhe os negacionistas do holocausto.
Agora aparece empenhada no negacionismo sistemático da realidade e das evidências científicas: a SIDA existe, mata milhões de pessoas por ano e nenhum programa de prevenção pode ser seriamente pensado ou implementado sem incluir a promoção do sexo seguro e o uso de preservativos, sobretudo em regiões do globo onde a SIDA é endémica.
Por outro lado, esta disparatada oposição ao uso profiláctico do preservativo assenta num falso pressuposto que tem sido alimentado por um certo clima de suspeição e cinismo. A ideia é que, se houver acesso ao preservativo, está-se a incentivar a promiscuidade sexual, quando nenhum indicador sério, nem nenhum estudo sistemático evidenciou este nexo de causalidade.
Ora nenhum organismo de saúde internacional, nenhuma ONG vocacionada para a promoção da saúde ou dos direitos humanos advoga que o uso do preservativo, isoladamente, é a panaceia para resolver as questões da transmissão da SIDA. Nem promovem ou incentivam a promiscuidade sexual ao facultarem o uso de preservativos ou fazerem ensinos sobre sexo seguro.
Muito pelo contrário. Todos os programas da OMS, da UNAIDS, dos MSF e das inúmeras associações (muitas delas católicas) que trabalham no terreno, advogam que as questões comportamentais, a redução do número de parceiros, a educação para a sexualidade são também elementos importantes na prevenção das DSTs em geral e da SIDA em particular. Mas, nesta abordagem a utilização adequada do preservativo não pode ser de forma alguma excluída, visto que é a única forma, comprovadamente eficaz de reduzir o risco de contágio numa relação sexual. E sabemos que a principal causa de infecção são as relações heterossexuais não protegidas.
Particularmente em áfrica, onde tantas mulheres e crianças são vítimas de abuso e violação, onde o casamento precoce de meninas é vulgar, onde as práticas de poligamia estão inculturadas em muitos grupos populacionais, onde o estatuto social das mulheres não lhes permite com eficácia ter uma efectiva autodeterminação sexual, a maoir parte das vezes a primeira linha de resposta tem de ser, necessariamente, possibilitar o acesso a relações sexuais protegidas, ou seja, ao preservativo.
Por tudo isto, o negacionismo do Papa é profundamente preocupante. O negacionismo pode ser confortável, mas negar sistematicamente a realidade, quando isso implica a destruição de vidas humanas, tudo em nome de dogmatismos estéreis e com frágil fundamentação teológico doutrinária , além de ser profundamente imoral, tem um preço.
O preço é uma Igreja caricatura do Evangelho, completamente desligada das pessoas e das dificuldades concretas que enfrentam. O preço é uma Igreja obesa e farisaica, mais preocupada com "a Lei" que com o homem, mais preocupada em manter um certo status quo que com a vida dos seres humanos.
E quando digo vida não me refiro a conceitos abstractos, mas de questões de vida ou morte de pessoas concretas, que vivem, respiram, sonham e amam.
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