quinta-feira, dezembro 11, 2008

Fevereiro

Iria fazer anos próxino dia 9 de Fevereiro. Quarenta e nove. Iria, porque já não vai. ( Tinha escrito provavelmente já não vai, mas apaguei o provavelmente). Há palavras que temos de escrever para se tornarem materiais, reais. Já não vai fazer mais anos.

Restam-lhe os cuidados paliativos, a morfina em doses certas.

Este ano sim, em Fevereiro deste ano 2008, brincou comigo como e costume .

Fazemos anos praticamente no mesmo dia e assim durante um dia , os anos que nos separam ficavam divertidamente encurtados. O que era motivo de private jokes.

Amanhâ vou vê-lo ao IPO. Porque sim. Para me despedir. Sem saber o que dizer. Talvez lhe fale do dia dos anos.E aquelas brincadeiras parvas sobre os aquarianos estarem muito à frente do seu tempo.

Vais primeiro, ainda nos havemos de encontrar algures e voltar a fazer anos quase ao mesmo tempo. Mas não penses que nas contabilidades da eternidade me vais enganar .

Não, não: vais ser sempre muito mais velho que eu ainda que eu morra com oitenta anos...

Como este ano de fevereiro de 2008, percebes? Não penses que morres tão cedo para ganhar a aposta.E prometo que não vou chorar. Não tenho esse direito.

2 comentários:

Anónimo disse...
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Anónimo disse...

Na madrugada em que a minha avó morreu, nessa noite fria em que eu não conseguia adormecer mas lá acabei por dormir,acordei a certa altura e senti algum alvoroço na casa... A minha mãe permanecia vigilante nesses últimos dias ... O burburinho suave continou e a certa altura ouvi um grito de certa forma estridente proferido pela minha avó; tinha passado a noite agitada e desorientada mas agora o seu sofrimento terminava. Tinha morrido. Morreu em casa no seu leito junto da sua família mas não teve um acompanhamento médico adequado; a medicação que lhe era dada por um enfermeiro todos os dias não era eficaz.
Nessa noite não fui capaz de me levantar e ir ao pé da minha avó acompanhá-la nos seus últimos momentos. Encolhi-me na minha cama e esperei que tudo ficasse bem como que pressentindo o que ia acontecer mas tendo esperança de que não acontecesse. A minha mãe foi quem cuidou dela sozinha e a muito custo... Quando tudo "acalmou", levantei-me para ir à casa de banho e a minha mãe disse-me. A única coisa que consegui dizer foi que era melhor assim e que todos já sabíamos que um dia ia acontecer, mas isso não era o que eu sentia pois senti muito a morte da minha avó que para mim era como se fosse também minha mãe. E não consegui chorar... Antes de a irem buscar para ir para a capela fui até ela que ainda estava na sua cama já vestida e muito bonita,olhei para a sua face dei-lhe um beijinho e apertei-lhe a mão que tantas vezes me acarinhou. E não consegui chorar. Mas despedi-me, e creio ter esperança que talvez um dia nos reencontre-mos num outro local quem sabe. Foi a última vez que olhei para ela, que tinha até um ar tranquilo; depois nunca mais fui capaz de olhar, talvez por medo das alterações que tivessem ocorrido na sua expressão... Não quis que a minha última memória da minha avó fosse a de uma face transfigurada. Ainda hoje sou capaz de me recordar perfeitamente da sua expressão e da sua face em vida, do seu sorriso afectuoso, da força e determinação que irradiava, .... Mas só consegui chorar a morte da minha avó passados muitos anos; no entanto até aí consegui de certa forma superar, compreender e aceitar.