Haverá actualmente mais casos de pedofilia entre o clero católico do que havia em épocas anteriores? A
resposta terá de ser negativa. Abusos sexuais em
conventos/mosteiros/colégios católicos e seminários sempre foram
recorrentes. Se alguma coisa mudou foi a tolerância social face ao tema.
A igreja sempre se defendeu corporativamente e de certa forma
alimentou (pela passividade conivente) estes esquemas sórdidos. Fazia
parte da tradição o muro de silêncio, ameaça e vergonha que tornou as
vítimas invisíveis e sem voz ao longo de milénios. Apesar de uma ou
outra intervenção pontual, mas apenas quando as vítimas eram rapazinhos
(não é à toa que a homossexualidade era designada pela inquisição como
o pecado dos padres). E quando as vítimas eram mulheres? Silêncio
ainda mais absoluto. Mesmo em casos verdadeiramente brutais de freiras
violadas por padres e bispos, só muito recentemente houve denúncias.
Sobre leigas e meninas vítimas deste abuso, o muro de silêncio é ainda
maior.
Se alguma coisa mudou foi precisamente um espírito de abertura que permitiu ás vítimas terem voz...
Onde radica este mal?
Provavelmente da imposição do celibato, que
levou a que um grande número de homens com parafilias e transtornos
sexuais se refugiassem na "carreira eclesiástica" durante séculos. (Santo
Agostinho é um bom exemplo de como uma sexualidade parafílica ou mal
resolvida pode originar sublimações místicas e doutrinas mais ou menos
desviantes sobre a moral sexual). Toda a investigação epidemiológica realizada na área da saúde mental
tem como ponto comum o seguinte achado: os homens celibatários (versus
os homens casados) correm maior risco de perturbações psiquiátricas (e ,já
agora, de doenças físicas), maior risco de suicídio e maior probabilidade
de apresentar disfunções sexuais graves e parafilias. Ou seja, o
estatuto de conjugalidade, nos homens, é um elemento estruturante,
protector de patologia e disfunções comportamentais graves. Dito
isto, uma "profissão", qualquer que seja, que tenha como base de
recrutamento homens "forçosamente" celibatários, implica um maior risco
de recrutamento de pessoas disfuncionais e perturbadas, mesmo do ponto
de vista da sua sexualidade. Repito, é um risco acrescido, não um determinismo absoluto. Quanto á questão do celibato não ser compulsivo mas uma opção pessoal / existencial, pode eventualmente reduzir esse risco.No
entanto, a liberdade humana para controlar impulsos biológicos nunca é
absoluta e, sendo a sexualidade humana, na sua expressão relacional, uma
necessidade humana básica, fundamental, tão importante como comer ou respirar, uma opção existencial que
tenha como pressuposto a "castração" permanente de impulsos estruturais
para o ser humano, não pode dar grande resultado a longo prazo.
Ou seja, é quase inevitável que saia pela janela o que tentámos fechar com a porta... Eu
não culpo o celibato - isso seria simplismo - mas considero que este é
um factor de risco estrutural que valeria a pena repensar.
E isto, aliado ao temor
reverencial (veja-se,como, ainda hoje, alguns hoje se ajoelham
tremulamente ante qualquer esvoaçar de batina), à "facilidade" no
acesso às vítimas e à sensação de total impunidade, explica a maior
ocorrência destes crimes em clérigos do que na população em geral. Já em 1922 o Papa Pio XI elaborou um documento, "Crimen Sollicitationis", sobre o problema.Tratava-se de normas a seguir nos casos de solicitação de sexo na altura das confissões (..)e
de outros delitos mais graves, como o abuso sexual de menores, pois já
há mais de 80 anos havia a consciência de que este problema existia. Só
que se foi sempre procurando que não transparecesse para fora dos muros
da Igreja.
De
notar que as regras rígidas dos colégios católicos tradicionais sobre a
moral sexual (incluindo as confissões obrigatórias carregadas de
devassa erótica sobre a sexualidade dos adolescentes) torna os abusos
mais fáceis. E quanto maior a adesão à "tradição" e ao conservadorismo pietista em matéria de sexualidade, piores os abusos.
Veja-se a irlanda.. onde o tradicionalismo doutrinário católico era tão
rígido...
Há que mudar o acessório para manter o essencial
A igreja sempre se defendeu corporativamente e de certa forma alimentou (pela passividade conivente) estes esquemas sórdidos. Fazia parte da tradição o muro de silêncio, ameaça e vergonha que tornou as vítimas invisíveis e sem voz ao longo de milénios. Apesar de uma ou outra intervenção pontual, mas apenas quando as vítimas eram rapazinhos (não é à toa que a homossexualidade era designada pela inquisição como o pecado dos padres). E quando as vítimas eram mulheres? Silêncio ainda mais absoluto. Mesmo em casos verdadeiramente brutais de freiras violadas por padres e bispos, só muito recentemente houve denúncias. Sobre leigas e meninas vítimas deste abuso, o muro de silêncio é ainda maior.
Se alguma coisa mudou foi precisamente um espírito de abertura que permitiu ás vítimas terem voz...
Provavelmente da imposição do celibato, que levou a que um grande número de homens com parafilias e transtornos sexuais se refugiassem na "carreira eclesiástica" durante séculos. (Santo Agostinho é um bom exemplo de como uma sexualidade parafílica ou mal resolvida pode originar sublimações místicas e doutrinas mais ou menos desviantes sobre a moral sexual). Toda a investigação epidemiológica realizada na área da saúde mental tem como ponto comum o seguinte achado: os homens celibatários (versus os homens casados) correm maior risco de perturbações psiquiátricas (e ,já agora, de doenças físicas), maior risco de suicídio e maior probabilidade de apresentar disfunções sexuais graves e parafilias. Ou seja, o estatuto de conjugalidade, nos homens, é um elemento estruturante, protector de patologia e disfunções comportamentais graves. Dito isto, uma "profissão", qualquer que seja, que tenha como base de recrutamento homens "forçosamente" celibatários, implica um maior risco de recrutamento de pessoas disfuncionais e perturbadas, mesmo do ponto de vista da sua sexualidade. Repito, é um risco acrescido, não um determinismo absoluto. Quanto á questão do celibato não ser compulsivo mas uma opção pessoal / existencial, pode eventualmente reduzir esse risco.No entanto, a liberdade humana para controlar impulsos biológicos nunca é absoluta e, sendo a sexualidade humana, na sua expressão relacional, uma necessidade humana básica, fundamental, tão importante como comer ou respirar, uma opção existencial que tenha como pressuposto a "castração" permanente de impulsos estruturais para o ser humano, não pode dar grande resultado a longo prazo.
Ou seja, é quase inevitável que saia pela janela o que tentámos fechar com a porta... Eu não culpo o celibato - isso seria simplismo - mas considero que este é um factor de risco estrutural que valeria a pena repensar.
E isto, aliado ao temor reverencial (veja-se,como, ainda hoje, alguns hoje se ajoelham tremulamente ante qualquer esvoaçar de batina), à "facilidade" no acesso às vítimas e à sensação de total impunidade, explica a maior ocorrência destes crimes em clérigos do que na população em geral. Já em 1922 o Papa Pio XI elaborou um documento, "Crimen Sollicitationis", sobre o problema.Tratava-se de normas a seguir nos casos de solicitação de sexo na altura das confissões (..)e de outros delitos mais graves, como o abuso sexual de menores, pois já há mais de 80 anos havia a consciência de que este problema existia. Só que se foi sempre procurando que não transparecesse para fora dos muros da Igreja.
Há que mudar o acessório para manter o essencial