domingo, fevereiro 17, 2013

Da chuva 1

Toda a noite, e pelas horas fora, o chiar da chuva baixou. Toda a noite, comigo entredesperto, a monotonia liquida me insistiu nos vidros. Ora um rasgo de vento, em ar mais alto, açoitava, e a água ondeava de som e passava mãos rápidas pela vidraça; ora com som surdo só fazia sono no exterior morto. A minha alma era a mesma de sempre, entre lençóis como entre gente, dolorosamente consciente do mundo. Tardava o dia como a felicidade - áquela hora parecia que também indefinidamente. 

Fernando Pessoa, Livro do desassossego

Sem comentários: