Noite dentro, enquanto a chuva mansa tamborila nas vidraças, Judite
rebola na cama, resfolegando como se fosse um animal. Uma égua ou uma
vaca. De lábios túmidos. Cabelos emaranhados. A pele recamada de bagas
de suor. Parece uma planta orvalhada. Uma deusa ignota, imperfeita.
Espera Judite que a escuridão do quarto tome a forma do corpo de um
homem.
Pensa Judite: quando a escuridão e o vazio se condensarem em corpo de homem, por fim, amainarei. A chuva continuará, mansa, a bater nas vidraças. Com calma, olharei para os ciprestes que lá fora permanecerão hirtos. Olharei para o homem deitado ao meu lado. Será grande como sempre o imaginei. Cabelo comprido. Barba negra como a escuridão que lhe deu corpo. Olhos de lobo, de lince, de leão, de cão esfaimado. Um bafo quente, nebuloso, sair-lhe-á de dentro. Será como um animal feroz sem açaime ou jaula.
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