domingo, dezembro 02, 2012

E paz

Todas as madrugadas Pierre sai de casa o mais suavemente que consegue, para não acordar ninguém. Todos os dias durante o ano, seja verão ou inverno, debaixo de neve ou da calidez anunciada dos dias de agosto. Às vezes, enquanto percorre a pé o caminho até à basílica, ergue os olhos para a via láctea e as últimas estrelas que resistem ao anunciar da manhã - pequenas velas que se acendem e apagam no céu, sob o suave respirar de deus.
Quando Pierre entra na igreja a escuridão húmida do silêncio é quase absoluta. A madrugada infiltra-se nos vitrais demasiado preguiçosamente. Às vezes faz tanto frio que, quando tira as luvas, tem de envolver as mãos com o seu próprio bafo para desentorpecer os dedos. E então, lentamente, como se acendesse a madrugada, Pierre começa a acender, uma a uma, as sessenta velas que iluminam  o altar. Uma pequena lareira começa a crepitar no coração da basílica, mesmo ao centro, onde o altar alaranjando irradia, propaga-se às abóbadas, ao chão, aos ícones, incendeia os vitrais com estranhos halos. No silêncio absoluto, Pierre acende as velas uma a uma. A cada vela que acende evoca um rosto, uma pessoa, uma memória, um pedido, uma alegria, uma paz, uma angústia, uma constelação. Sessenta velas.
Quando o trabalho termina, Pierre ajoelha-se no centro da igreja e contempla o altar, onde sessenta pessoas cintilam a mornidão da luz do amor. 
Inclina-se suavemente a agradece.
A sua oração da manhã terminou.

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