segunda-feira, julho 05, 2010

Da vida

" A sua cabeça descaiu um pouco na minha direcção. Soergui-a ligeiramente e aconcheguei-a a mim.
Teve, então uma pausa respiratória. Uma vez mais, surpreendi-me a querer fazer alguma coisa, instalar os tubos de oxigénio. De seguida mudei de ideia.
Ela estava a morrer, tinha-mo anunciado. Por que iria eu perturbar esse momento, tão singelo, tão intimo? Inspirou uma golfada de ar e, a seguir, deixou outra vez de respirar durante uns minutos. Sussurrei-lhe ao ouvido algumas palavras de ternura que me invadiam por elas próprias, sei lá de onde. Podia ser minha filha, e as minhas eram palavras de mãe, que pertenciam sem dúvida à alma de todas as mães, palavras vindas da eternidade. Pela segunda vez, recuperou o fôlego. Cruzou-se em mim a imagem de um pobre peixe caído na areia. Gostaria de o lançar de novo á agua. Gostaria de lhe voltar a dar vida. Vinham-me as lágrimas aos olhos. Nunca vivera um momento de tal intensidade. Ela parou, pela terceira vez, de respirar, e a tensão do seu corpo esvaziou-se subitamente. Percebi que acabava de morrer."


(Marie de Hennezel; Jean Yves Leloup-A Arte de Morrer)

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