A ceguinha tropeça nos sapatos novos antes de conseguir adaptar-se ao tamanho dos saltos.
Acha-se linda, mesmo sem se ver, o que lhe reconforta o pequeno ego esfíngico recheado de rugas.
Tem quase setenta anos e ainda assim, usa pulseiras que tilintam e medalhas coloridas de santinhas milagreiras que a protegem do mau olhado.
Quando era pequena o pai obrigava-a a cantar em feiras a vender-pagelas-azuis-em-quadras-apocalípticas. Quando ele morreu foi recolhida por uma dessas instituições asilo do Estado Novo, que alojava pedintes, loucos e pessoas com ideias políticas suspeitas.
Agora recusa-se a cantar, acha todas as músicas aflitivas.
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