"Tivemos,
advogadas e juíza, que nos chegar perto da testemunha para que nos ouvisse.
Gritámos-lhe as perguntas ao ouvido, sentindo-lhe um cheiro adocicado de lar de
idosos. O velho respondeu, gagá, balbuciando umas frases com sentido, outras sem
o ter. Chamou-nos santinhas - ó santinha, toda a gente no prédio sabia que o
Capitão Matos tinha uma caçadeira e dormia a sesta com a Fernanda, por sinal,
bem boa! - eu a escutá-lo, a moer para dentro, sabendo bem que, se em vez de
mulheres, o estafermo do velho tivesse apanhado juiz e advogados, adoptaria
outra postura, havia de se esmerar na formalidade sebosa, no unto subserviente,
Sr. Doutor Advogado isto, Senhor Doutor Juiz aquilo. No final, a juíza
agradeceu-lhe o depoimento. O velho levantou-se a custo e começou a andar
devagar, tremelicando, apoiado numa bengala de madeira encerada. Em pouco tempo
se finará, sete palmos de terra por cima, coroas de gerberas e cravos brancos a
alindar. Ia a meio do
caminho, passava pela minha bancada, quando pediu autorização à juíza para me
dedicar uns versos. A santinha lá de cima, galhofeira, rubicunda, rubiácea,
rubiforme, assando dentro da sua beca cheia de cordões e preguinhas, autorizou.
O velho encheu o peito de ar. Explicou que na vida tivera quatro paixões: a
rádio, a columbofilia, a poesia e as mulheres. Depois, abriu os braços, temi que
ao largar a bengala se estatelasse no chão, fez da sala de audiências palco e
debitou uns versos mal amanhados sobre uns olhos castanhos. Agradeci-lhe, no
fim, como me competia, triste com a minha sina: só os velhinhos têm apreço pela
minha pessoa. "
Anna de Amsterdam
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