"A Igreja Católica se encontra em um momento de passagem. Vai rumo a uma outra coisa, rumo a uma outra maneira de fazer Igreja, o que por si só não é trágico. Toda mudança, é verdade, tem um aspecto inquietante, porque produz rupturas, aflições, fraturas. E essas palavras, que são tomadas do vocabulário corporal, por si só evocam sofrimentos e perigos. Mas essa evolução será o advento de uma era nova, que eu ainda não posso imaginar para a Igreja nem para a fé cristã, mas que não será necessariamente catastrófica.
Não prevejo, de modo algum, uma retomada do poder, do poder perdido pela Igreja sobre a sociedade, mas sim uma outra maneira de se situar no mundo e de guardar a sua unidade. Talvez, ela terá menos visibilidade, no sentido de que a sua visibilidade atual está amplamente ligada à sua estrutura hierárquica e clerical. Mas a sua hierarquia perdeu muito da sua credibilidade interna e externa por causa dos seus excessos de poder sobre os seus fiéis e com relação à sociedade. E o clero, dada a perda de recrutamento, logo não poderá mais ocupar sozinho todos os postos de autoridade e de responsabilidade que lhe eram devidos.
A maior visibilidade da Igreja passará, assim, para o campo dos leigos e leigas, porque haverá cada vez menos clérigos e, portanto, será preciso confiar aos leigos e leigas um número cada vez maior de postos de responsabilidade. A Igreja terá menos visibilidade por causa da forte diminuição do número dos seus fiéis, e uma visibilidade diferente, menos "vistosa", se assim posso dizer, pelo fato de que a sua dominante leiga não a diferenciará mais tão fortemente do resto da sociedade; lhe dará um rosto menos especificamente religioso, menos cultual e ritual. [...] Imaginar uma tal evolução me enche de esperança, eu confesso, embora certamente haverá menos pessoas que se dirão católicas. Mas o pensamento de muitas pessoas que estão deixando a Igreja continua a me perturbar. Não que eu tema que o seu abandono da Igreja os condene ao inferno – porque eu não acredito que Deus persiga com a sua cólera aqueles que dEle se esqueceram –, mas porque a perda de toda vida espiritual os colocaria em perigo de afundar para sempre na morte, se é verdade, para os crentes, que não existe vida eterna a não ser na união com Deus (p. 147-149)."
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