Dona Rosalina, dizia assim, " onde comem quatro, comem seis".
E assim era, como que por mágica repartição do pão, mais um pouco de água no refogado, azeite, uma pitada de condimentos certos, a parca carne partida em bocados mais miúdos, mais um bocado de massa ou ervilhas, o guisado miraculosamente expandia-se na panela, e a comida, que parecia pouca, às vezes ainda sobrava depois de todos saciados. Claro que Dona Rosalinda era sempre a última a comer e às vezes contentava-se com os pequenos restos dos pratos que raspava meticulosamente com um bocado de pão..
Era um tempo antigo, salazarento, onde as crianças passavam fome e morriam como tordos. Não havia semana em que o sino não tocasse para mais uma procissão de "anjinhos" e um talhão inteiro do cemitério estava-lhes dedicado. Por isso Dona Rosalinda abria as portas da cozinha aos sábados e os miúdos vinham em bando ao fim da tarde - um malga de sopa, meia dúzia de azeitonas, bacalhau seco e um guizado de chorar or mais. Às vezes a catraida era tanta que o coelho acabado de matar não dava mesmo para todos - mas ainda assim, o suculento arroz pingava nos pratos e a miudagem lambuzava-se como podia.
Talvez tenha salvo algum catraio da procissão dos anjinhos, pensava ela.
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