quinta-feira, março 29, 2007


Sobre a base biológica da delinquência ou da agressividade parecem não existir dúvidas.


Aliás, se a inimputabilidade por anomalia psíquica é admitida no código de direito penal, precisamente porque se considera que há certas doenças mentais que impedem as pessoas de fazerem adequadamente um juízo de valor entre o bem e o mal, ou de decidirem l agir em liberdade - de se autodeterminarem livremente de acordo com padrões morais.

E sabemos hoje, claramente que há
pessoas que são incapazes de sentir remorso ou culpa, por mais atrozes ou violentas que tenham sido as acções cometidas.

Não sabíamos até aqui que essa “anestesia moral” correspondia a lesões cerebrais específicas.

Onde está a liberdade humana, então?

Ela começa e termina nas estruturas cerebrais intactas e saudáveis, de um cérebro adulto.

5 comentários:

Anónimo disse...

Bem, continuamos… ;-)

Falar de «base biológica» pode ter muitos sentidos. A extensão e «força constituinte de tal base é, certamente, motivo de discussão.

Uma das grandes questões é realmente essa: «Onde está a liberdade, então?»

Para minha surpresa, responde-se: «Ela começa e termina nas estruturas cerebrais intactas e saudáveis, de um cérebro adulto».

Ora bem, «hoc porca rabus torcit», como dizia o outro…

- Se a liberdade começa e termina nas estruturas cerebrais podemos ainda falar de liberdade?

- Se o meu agir é umas vezes mais livre que outro e posso ter num curto espaço de tempo duas acções, em que uma é bastante livre e a outra não o é, isso deve-se à variabilidade em termos de saúde das minhas estruturas cerebrais?

Alef

BLUESMILE disse...

"isso deve-se à variabilidade em termos de saúde das minhas estruturas cerebrais? "

Precisamente... ( ou dos níveis de neurotransmissores ou dos níveis de determinadas hormonas, ou da exposiçção ou não a determinadas substãncias, etc, etec...)
O que é mais fascinante é que o comportamento humano pode condicionar essa variabilidade orgãnica...

Mas mesmo esse condicionamento é...neuroquímico, logo, biológico...

Eis-nos reduzidos ao nosso limite de carne pensante e vísceras lógicas.

E aí começa e acaba a nossa liberdade.

Anónimo disse...

Então, se é assim, e usando a ainda a terminologia do comentário anterior, podemos estar doentes-e-não-doentes ao mesmo tempo, o que parece ser contraditório, porque em dois actos simultâneos um deles pode ser livre e o outro não...

Já agora, como se pode, neste modelo, saber que um acto é livre? Enquanto coloco estas questões estou a ser «controlado» pelos mesmos processos neuroquímicos, pelo que a nossa existência poderá não passar de um complicado «Matrix»...

Outra questão interessante será averiguar uma «mecânica» da moralidade... Significaria isto estabelecer uma relação directa entre moralidade e «saúde das estruturas cerebrais» e imoralidade com o seu contrário? Hummm...

Em termos tradicionais (aristotélicos), não será que se confunde aqui causa eficiente com causa formal, ou seja, aquilo que produz uma coisa com aquilo que é essa coisa? Não será esta visão das coisas um reducionismo metafísico?

Isto põe problemas sérios em termos de responsabilidade... Ou seja, tem ainda sentido falar de liberdade? Será o homem uma paixão inútil?

Neste cenário, que razões tenho eu para agir moralmente? Que razões válidas tenho eu para tentar convencer alguém de que é preferível fazer o bem e evitar o mal aos seus contrários? Que sentido tem discutir a defesa dos direitos humanos com o Governo chinês?

Alef

BLUESMILE disse...

"como se pode, neste modelo, saber que um acto é livre? "

"Enquanto coloco estas questões estou a ser «controlado» pelos mesmos processos neuroquímicos...."

O facto de dependeres de processos neuroquímicos para "colocares"(pensares) estas questões não significa que não possas ser livre.

O "pensamento" ( e, sobretudo, o acto de" pensar-se " )resulta de processos neuroquímicos complexos de ainda não apreendemos completamente mas que dependem de uma base biológica. Não há autoconsciência, nem sentido do self, nem juízo moral, nem acção, nem volição, sem um substracto orgãnico - um cérebro íntegro e funcionante.

Por isso algumas doenças mentais têm como principais sintomas e sinais patognonómicos - as alterações do pensamento...

Ou seja, pensamento nunca é metafísico mas absolutamente físico, strictu sensu..

Chamar a esta evidência um redicionimo metafísico é capaz de ser um paradoxo.

Quanto á questão da universalidade dos direitos humanos ( e dos direitos dos animais, já agora) , é um tema diferente.
;)

Anónimo disse...

Dizes que a dependência dos processos neuroquímicos não significa que não possa ser livre. Muito bem; já estava «assustado»... ;-) Mas então estará correcta a formulação que diz que «a liberdade começa e termina nas estruturas cerebrais»? Não precisa de ser clarificada esta formulação?

Não se confunde a causa eficiente (ou, eventualmente, «material») com a causa formal, isto é, aquilo que inicia ou acompanha o processo com aquilo que o processo é em si mesmo? Pegando no exemplo clássico da estátua de bronze: uma estátua reduz-se ao bronze utilizado para a fazer? Este é, a meu ver, um dos grandes erros naquilo que tenho visto por cá. Uma coisa é o registo das estruturas biológicas ou neuroquímicas presentes no processo de pensar, outra, bem diferente, é identificar essas estruturas com o pensamento propriamente dito, ou com a inteligência, com a vontade/volição ou com o sentimento.

De resto, fica a pergunta: neste «modelo», a que poderemos chamar «neo-mecanicista», o que é que diferencia os humanos dos restantes animais?

Dizes que «o pensamento nunca é metafísico, mas absolutamente físico, stricto sensu».

Que significa aqui «metafísico»? Que significa aqui «físico» «stricto sensu»? É que «físico» tem muitos sentidos, e qualquer um deles pode ser referido «stricto sensu». E num dos sentidos a afirmação pode ser correcta, mas poderá não o ser noutros.

Dizer que o pensamento nunca é metafísico não é uma afirmação também ela metafísica? E não é pensada?

Mas não se confunde aqui pensamento com pensar?

Já antes dizias que «a moral é biológica e nada transcendente». Como sabes isto? Que sabes do transcendente para poder afirmar isto?

Quanto à questão dos direitos humanos, enquadrei-a devidamente e só nesse sentido a invoquei: se a moralidade e liberdade começa e termina nas estruturas cerebrais e depende(m) do seu bom funcionamento e se não existem normas morais universais, se tudo se reduz à base biológica, por que razão tentamos persuadir os outros de que uns actos são mais aceitáveis que outros, que é moralmente pertinente o respeito pelos direitos humanos?

E a propósito da inexistência de normas morais universais: existe alguma cultura que seja contrária à frase: «deve fazer-se o bem e evitar o mal»?

E a estátua é o bronze de que está feita? O pensamento ou o agir moral reduz-se aos elementos determináveis biologicamente?

Alef