Dona domingas gosta de falar ao telefone. Fala muito alto e na voz esganiçada que lhe vem de muitos anos de silêncio aflito. Dona domingas está habituada a que a mandem calar e, talvez por isso, sempre que pode exprime-se em decibéis elevados. Afaga lentamente as teclas do telemóvel depois de o desinfectar com o produto contra a gripe A que comprou na farmácia e que carrega na carteira para todo o lado, como se fosse um frasquinho de água benta. Dona domingas tem muito medo das doenças talvez porque se lembra das maleitas que o ex-marido trazia para casa e que a obrigavam a ablações humilhantes. Liberta do marido - morto por fim duma maleita qualquer - dona domingas fala alto ao telemóvel na paragem de autocarro, longe da voz da filha que lhe costuma gritar aos ouvidos:
- Cala-te mãe, cala-te.
E dona dominga calada, o telemóvel no saco castanho ao pé do frasquinho de água benta.
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