quarta-feira, dezembro 13, 2006

Úteros transparentes



Durante milénios o útero foi um lugar obscuro e enigmático, cerne das mais bizarras patologias, explicadas por uma misteriosa conexão entre um útero instável ou faminto e os comportamentos / estados emocionais que se diziam ser estritamente femininos.
Apesar de sempre ter havido homens histéricos ( com transtornos conversivos e dissociativos) a histeria foi relacionada pela medicina clássica como uma doença de mulheres, uma doença do útero ( a raiz etimológica do termo indicia o conceito).
Esta imagética da mulher de entranhas ávidas e obscuras, regida pela lua ( e por isso aluada ou mesmo alumbrada), com ciclos de fertilidade animais e capacidade insaciável de desejo erótico, foi parcialmente sublimada pela construção de uma mitologia e iconografia da maternidade redentora.
A maternidade – e só ela – redime amulher desta animalidade atávica e misteriosa que germina no seu útero doentio – assim purificado e reduzido à sua função essencial que é também a função essencial identificadora de qualquer mulher – a reprodução.
Ou virgem e puta, ou mãe redimida e redentora.

1 comentário:

Vítor Mácula disse...

Só para dizer-te que a voz que procuras trazer à liça, a da mulher e tua, é um milagre da consciência que urge fazer.

Muito obrigado, caríssima. Muitos lobos te hão de morder as canelas, mas que prossiga a profética caravana.

Beijos.