quarta-feira, fevereiro 21, 2007

No meu país não.



O que distingue a civilização da barbárie é a estreita linha que separa o Estado de normas e crenças religiosas.

O que distingue a civilização da barbárie é o respeito pelas mulheres.

Foto – Sharia: jovem mulher iraniana prestes a ser apedrejada

Dª Elvirinha morreu a semana passada. Deixou de passear pelos corredores em longas marchas intermináveis, rosto esguio, olhar impenetrável, um tom de voz imponente, lencinho cuidadosamente enrolado á volta do pescoço, e as bijouterias compradas na feira que ela exibia como jóias.
Mais do que o penteado irrepreensível , Dona Elvirinha exibia uma pose de aristocrata embevecida, nunca se soube ao certo se fruto de algum delírio de grandeza se resquícios de um passado obscuro.
Nada de sorrisos fáceis, de convívios excessivos ou demasiadas futilidades com as outras internadas com quem partilhava o espaço de confinamento existencial do manicómio… Vinte, trinta, quarenta anos de internamento numa instituição psiquiátrica transformam o internado num produto da instituição, normativizando as condutas e a identidade. Mas Dºa Elvirinha evitava a normalidade, as provocações ou as pequemas maledicências institucionais com uma frase única : Eu sou uma senhora. E estava tudo dito.

O corpo


O corpo não espera. Não.
Por nós ou pelo amor.
Este pousar de mãos,
tão reticente e que interroga a sós
a tépida secura acetinada,
a que palpita por adivinhada
em solitários movimentos vãos;

este pousar em que não estamos nós,
mas uma sede, uma memória,
tudo o que sabemos de tocar desnudo
o corpo que não espera;
este pousar que não conhece,
nada vê, nem nada
ousa temer no seu temor agudo...

Tem tanta pressa o corpo! E já passou,
quando um de nós ou quando o amor chegou.

Jorge de Sena